Sócrates já dizia o óbvio: “Você não sabe o que não sabe”. Esse pensamento nunca fez tanto sentido quanto na sociedade moderna. O maior perigo não está em não saber, mas em não saber que não se sabe. O pensamento socrático nos ensina que reconhecer a própria ignorância é o primeiro passo para se alcançar a verdade e a sabedoria.
No entanto, o reconhecimento da própria ignorância é, paradoxalmente, uma habilidade que as pessoas que se consideram esclarecidas geralmente não têm.
Vivemos bombardeados de informações por todos os lados, o que não significa que elas nos aproximam da verdade ou aumentam a nossa compreensão da realidade. A armadilha está em acreditar que a mera abundância de informações nos deixará suficientemente bem-informados. Como diz Yuval Harari, a informação nada mais é senão uma tentativa de perceber realidade, mas não é a realidade em si. Sem o exercício do pensamento crítico, ela se transforma facilmente em desinformação.
O pior ignorante é aquele que sabe apenas a metade da história. Conhecimento funciona como geleia: quanto menos se sabe mais se tenta espalhar.
Existem lacunas no nosso conhecimento que não estamos dispostos a confrontar. É mais fácil reforçar as crenças que confirmam o nosso universo familiar do que lidar com verdades que podem ser dolorosas e desafiadoras. É esse o maior problema: as mentiras podem ser mais confortáveis do que a verdade.
Transformar dados em conhecimento, requer uma dose de humildade intelectual, pois a construção humana é incapaz de capturar a totalidade da realidade. Tão abundantes quanto as informações, são as pessoas que não têm humildade intelectual, que têm uma confiança desproporcional –e muitas vezes ilógica– em suas próprias convicções. Não por coincidência, são as que mais compartilham conteúdos emitindo (replicando) opiniões sobre tudo, sem ter absorvido e refletido minimamente sobre a verdade dos fatos.
O fluxo insistente de informações tem o mesmo efeito da falta de informações: a desinformação. Ele é usado como um instrumento de controle e polarização. Histórias são editadas, inimigos são fabricados, medidas extremas são justificadas. Os livros de história nos mostram o quanto isso é perigoso.
Não nos enganemos que é um fenômeno exclusivo dos regimes totalitários. A desinformação representa risco grave para democracias modernas e sociedades abertas, que parecem caminhar para a ruína.
Distorções são o prato cheio para confundir o debate público e tornar indistintas medidas repressivas de atos de resistência legítimos. Situações antes consideradas inaceitáveis, foram normalizadas: a legitimação do terrorismo como uma forma possível de se negociar; o negacionismo da ciência; a relativização de direitos fundamentais; a negação de mudanças climáticas –o que tem retardado ações urgentes para se combater a crise ambiental.
A desinformação já fez os seus estragos mais perigosos: minou princípios éticos e morais, corroeu a confiança nas instituições e intensificou a polarização e o ódio.
Estamos condenados, então, a repetir mentiras até que elas se tornem verdades em nossas mentes?
Talvez, o maior problema não seja a mentira, ou a estupidez –ambas condições inevitáveis que nem os mais inteligentes escapam–, mas a aversão à sensatez e o desprezo pela verdade.
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noticia por : UOL