segunda-feira, 19, maio , 2025 07:10

E você, já fez o Pix para o Bolsonaro hoje?

O ex-presidente Jair Bolsonaro está pedindo a sua contribuição. De novo. Via Pix. Ora, aqueles que Nelson Rodrigues (não eu!) chamava de “idiotas da objetividade” dirão que Bolsonaro não pediu nada e que estou sendo maldoso como um típico e maldito jornalista esquerdopata qualquer. Quem pediu foi o ex-ministro do Turismo e a justificativa para o pedido seriam os gastos do Bolsonaro-pai com advogados, médicos e com o Bolsonaro-filho que está nos Estados Unidos.

Antes que se acumulem os xingamentos e a gritaria, porém, permita-me dizer que, neste texto, o Pix para Bolsonaro é mero chamariz para falar de algo mais importante: o nascer do Sol que observei aqui da janela de casa hoje pela manhã. Enlouqueci? Que nada! É que me dei conta de que às vezes precisamos fazer uma escolha: ou chafurdamos nessa política do eu-tô-com-a-razão/não-eu-é-que-tô-com-a-razão ou contemplamos a vida. E só por hoje decidi contemplar a vida. No mais, você conhece meu texto, então siga lendo até o fim, por favor.

Isso não é nem política!

Ah, mas aqueles cronistas chatos de antigamente faziam justamente isso de ficar contemplando a vida – e por isso eram chatos e eram de antigamente. Paciência. Não vou flanar nem dar voz a “um sábio, miserável e anônimo guardador de carros sob o efeito de crack”. Nada disso. Só vou dizer que essas picuinhas, esses nadas que se passam por debate de ideias, esse vazio que só interessa a uma gente robótica, cujo discurso é cuidadosamente construído por marqueteiro ainda com espinha na cara…

Nenhuma dessas coisas é VIDA. Por outra, é um simulacro de vida. Uma distração. Entretenimento de baixíssima qualidade. Se você parar para pensar um segundo, não é nem política. É só um blá-blá-blá que não leva a lugar nenhum, que não muda muito menos melhora a vida de ninguém, que não almeja bem comum coisíssima nenhuma. Que não ensina nem aprende nem troca. Que não vai pôr o Lula na cadeia de novo nem vai impedir Alexandre de Moraes de fazer o que ele quiser.

Me recuso

Taí. Falamos tão mal dos cronistas que subiam em árvores para observar passarinhos, nos desacostumamos tanto da poesia em prosa do cotidiano (coisa de gente fresca!), fechamos com tanta força os olhos para o que acontece nas nossas esquinas, que hoje somos obrigados a ler (e, no meu caso, escrever) obviedades e mais obviedades, lugares-comuns e discursos cheios de bordões, e sempre com uma mesma e única referência intelectual: uma porcaria de distopia qualquer. Me recuso. Porque você, leitor, merece mais.

É por causa desse nada, aliás, que cada vez mais ouço leitores reclamando, quando não desistindo de acompanhar o noticiário. Uns até falam em cancelar a assinatura da Gazeta do Povo (mas felizmente não cancelam). Porque o debate meramente abstrato, de uma abstração sem qualquer conexão com a vida real, esse lenga-lenga que só tem como objetivo a promoção pessoal, não interessa a ninguém. Cansou. Já deu. Por quê? Você ainda me pergunta por quê?! Porque faz mal. As pessoas perceberam que a vida está passando e que é até pecado desperdiçá-la com essa raiva, essa indignação estéril, esse espírito revolucionário todo.

Só por hoje

Pois então. O nascer do Sol visto aqui de casa estava lindo, num tom de rosa que a câmera do celular infelizmente corrigiu para uma cor mais quente. Não tem problema. O contorno imutável das montanhas, o mundo despertando, umas nuvens que parecem uns garranchos de fogo, o horizonte que não acaba mais e as luzes se acendendo em milhares de casas, cada qual cheia de vida e drama e possibilidades insondáveis.

Sério. O que é o Pix do Bolsonaro perto dessa dádiva que você e eu insistimos em trocar pelo diálogo de surdos das redes sociais? Doa quem quer. Não tenho nada a ver com isso e, pensando bem, talvez um Pix para Bolsonaro seja dinheiro mais bem gasto do que, sei lá, num bebê reborn. Ou numa aposta no Tigrinho. Pensando melhor ainda, confesso certa inveja de quem, a esta altura do campeonato, ainda faz doações ao ex-presidente.

Meu lado cínico vai dizer que é estupidez, mas, cale a boca, lado cínico! Cale a boca, traga minha ingenuidade de volta e, só por hoje, se permita ignorar esse fuzuê inútil para admirar esta maravilha de aurora:

noticia por : Gazeta do Povo