Novo acordo do país com o FMI e primeiro dia de redução dos controles cambiais no país, o chamado ‘cepo’, influenciaram o mercado argentino nesta segunda-feira (14). Notas de pesos, na Argentina.
Reuters
O peso argentino despencou nesta segunda-feira (14), enquanto os mercados de ações e títulos do Tesouro registraram fortes altas. O pregão foi marcado pelo primeiro dia de redução dos controles cambiais, o chamado “cepo”. (entenda mais abaixo)
A restrição do cepo, anunciada na última sexta-feira (11) pelo banco central da Argentina, determina o fim da paridade fixa para a moeda argentina e introduz o “câmbio flutuante” — quando o valor da moeda é determinado pela oferta e demanda do mercado.
Com isso, o governo de Javier Milei ensaia o fim do sistema de restrição cambial que estava em vigor desde 2019, limitando a compra de dólares e outras moedas estrangeiras pelos argentinos.
Junto com a redução do controle cambial foi anunciado que a Argentina fechou um acordo de US$ 20 bilhões com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Segundo o ministro da Economia, Luis Caputo, o dinheiro permitirá a “recapitalização do BC para ter uma moeda mais saudável e continuar o processo de desinflação”.
No primeiro dia útil após os anúncios, a moeda argentina se desvalorizou 11,38% em relação ao dólar. Mas o S&P Merval, índice que mede o desempenho das ações mais líquidas da Argentina, registrou alta de 4,70%.
Entenda abaixo o que se sabe sobre o acordo com o FMI e sobre a nova política cambial do país.
O que mexeu com os mercados argentinos nesta segunda-feira?
Qual é a nova política cambial da Argentina?
Por que Milei implementou uma nova política cambial?
O que essa nova política pode fazer pela Argentina?
Qual o acordo feito entre a Argentina e o FMI?
A Argentina pode voltar para o mercado de capitais?
Títulos da Argentina sobem com suspensão de controle cambial
O que mexeu com os mercados argentinos nesta segunda-feira?
A desvalorização do peso argentino e a forte alta no mercado de ações e nos títulos públicos refletem as novas políticas de câmbio anunciadas pelo presidente da Argentina, Javier Milei, na semana passada.
O S&P Merval, índice que mede o desempenho das ações mais líquidas da Argentina, avançou 4,70%.
As principais empresas argentinas listadas nas bolsas americanas também tiveram forte alta no dia.
Veja o desempenho:
YPF Sociedad Anonima subiu 10,26%
Grupo Financiero Galicia SA ADR subiu 14,05%
Grupo Supervielle SA subiu 18,07%
Banco Macro SA B ADR subiu 15,41%
BBVA Argentina subiu 14,78%
Despegar.com (Decolar) teve leve recuo, de 0,05%
“A suspensão ou o levantamento de medidas como o ‘cepo’ cria um ambiente melhor para o mercado, sobretudo no médio e no longo prazo”, diz André Galhardo, economista-chefe da consultoria Análise Econômica.
“Da mesma forma que o mercado entende que é melhor diminuir os gastos do governo e reduzir a presença do Estado na economia, isso vale também para controles cambiais”, diz.
Enquanto isso, o peso se desvalorizou. Para cada dólar, passaram a ser necessários 1.196,31 pesos no fechamento desta segunda-feira. O valor representa uma alta de 11,38% em relação à última sexta-feira, quando o controle cambial do país estabelecia a moeda norte-americana a 1.074 pesos.
Segundo Galhardo, essa queda do peso é resultado de uma maior demanda por dólares. “Certamente, a retirada de parte das restrições atendeu a uma demanda reprimida pela moeda norte-americana”, explica.
“Isso resultou em um desequilíbrio momentâneo entre oferta e demanda, encarecendo o dólar.”
Qual é a nova política cambial da Argentina?
O novo regime de taxa de câmbio da Argentina acaba com o chamado “cepo” — uma série de restrições cambiais impostas pelo governo em 2019 para controlar a compra e venda de dólares.
Na época, o governo implementou a medida para limitar a compra de moeda e evitar a fuga de capitais para estabilizar a economia argentina, em meio a problemas nas contas públicas e alta dos preços.
Agora, a nova política cambial de Milei permitirá que o peso argentino flutue livremente entre 1.000 e 1.400 pesos por dólar — a política anterior era de câmbio fixo. Na última sexta-feira, por exemplo, a moeda estava em torno de 1.074 pesos por dólar.
O governo argentino detalhou que a nova faixa móvel se expandirá em 1% a cada mês, tanto no limite superior quanto no inferior, e o BC poderá comprar e vender dólares se esse intervalo for quebrado.
O BC argentino também explicou que, enquanto a moeda flutuar dentro dos limites estabelecidos, a instituição poderá operar nos mercados secundários por meio de operações de mercado aberto — são operações realizadas para controlar a oferta da moeda e ajudar no controle da política monetária.
De acordo com o FMI, a ideia de restringir o controle de câmbio é fazer com que a estrutura monetária da Argentina evolua para uma “taxa de câmbio totalmente flexível no contexto de um sistema bimonetário” — em que o peso argentino e o dólar coexistem e podem ser usados simultaneamente.
Outro ponto anunciado pelo governo argentino foi o fim do chamado “grampo de dólar”, que restringia o acesso à moeda estrangeira. A partir deste ano, as empresas poderão enviar lucros para fora do país, o que pode liberar mais investimentos de multinacionais.
Por que Milei implementou uma nova política cambial?
Segundo o ministro da Economia da Argentina, Luis Caputo, a antiga política cambial “limitava o funcionamento normal da economia”.
A ideia, segundo o governo, é que as novas medidas, somadas aos recursos cedidos pelo FMI, possam tornar a moeda mais saudável, reduzir a inflação e permitir cortes de impostos.
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O que essa nova política pode fazer pela Argentina?
Adriana Dupita, economista de mercados emergentes da Bloomberg Economics, destaca que a mudança no controle do câmbio pode ajudar a elevar o fluxo de exportações do país, beneficiando a balança comercial.
“A taxa de câmbio até a última sexta era tão barata que estimulava demais as importações e desencorajava as exportações. Assim, o saldo comercial do país vinha caindo e havia risco de caminhar para o negativo em breve”, afirma.
Ao mesmo tempo, os investidores estrangeiros não estavam enviado dólares para a Argentina, já que não teriam como retirar — devido às regras do cepo.
“Assim, a mudança do regime cambial ajuda tanto a evitar uma sangria de dólares pelo lado da balança comercial como cria a possibilidade de haver entrada de dólares pela via financeira.”
Qual o acordo feito entre a Argentina e o FMI?
A Argentina fechou um acordo de US$ 20 bilhões (aproximadamente R$ 116,9 bilhões) com o Fundo Monetário Internacional, com prazo de 48 meses, na última sexta-feira.
Segundo o governo argentino, o país deve receber US$ 28 bilhões (R$ 163,6 bilhões) somente em 2025, incluindo:
US$ 15 bilhões (R$ 87,6 bilhões) do FMI;
US$ 6,1 bilhões (R$ 35,6 bilhões) de outros credores multinacionais;
US$ 2 bilhões (R$ 11,7 bilhões) de bancos globais; e
US$ 5 bilhões (R$ 29,2 bilhões) da extensão de um swap cambial com a China — esse é um acordo feito entre os bancos centrais dos dois países que permite que as instituições troquem moedas, o que ajuda a fortalecer suas respectivas reservas internacionais.
A ideia é que o FMI desembolse US$ 12 bilhões (R$ 70,1 bilhões) nesta semana, seguido de uma revisão do programa em junho que deverá liberar mais US$ 2 bilhões (R$ 11,7 bilhões), e uma nova revisão no final do ano com mais US$ 1 bilhão (R$ 5,8 bilhões).
“Esses recursos líquidos serão usados para fortalecer o balanço patrimonial (do banco central) por meio da recompra de títulos intransferíveis pelo Ministério da Economia”, informou o banco central da Argentina na última semana.
O acordo com o FMI ainda estipula que a Argentina acumule reservas internacionais líquidas no valor de US$ 4 bilhões (R$ 23,4 bilhões) até o final do ano, em comparação com o nível registrado em 31 de dezembro de 2024.
Essa meta de acúmulo de reservas fará com que esse processo se acelere para um aumento de US$ 8 bilhões (R$ 46,7 bilhões) no próximo ano.
Embora o governo de Milei tenha feito do acúmulo de reservas um dos principais focos e tenha tido algum sucesso, esse cenário se reverteu nas últimas semanas, em meio à crescente pressão sobre o peso. Com isso, as reservas líquidas caíram para US$ 7 bilhões (R$ 40,9 bilhões) negativos, de acordo com uma estimativa do FMI.
Por fim, o acordo entre a Argentina e o FMI também prevê um cenário de superávit (receitas maiores que despesas) fiscal primário este ano de 1,3% do PIB. Esse crescimento ainda seria um pouco abaixo do ano passado, embora Caputo já tenha sugerido que o governo terá uma meta mais alta, em torno de 1,6%.
A meta fiscal geral — incluindo o pagamento da dívida — visa a um equilíbrio fiscal este ano. O superávit primário e geral começaria a aumentar no próximo ano e nos anos seguintes.
A Argentina pode voltar para o mercado de capitais?
Segundo o FMI, se houver uma “implementação decisiva” do programa e um rápido acúmulo de reservas, isso poderá reduzir os custos de empréstimos para a Argentina e fazer com que ela volte a acessar os mercados de capitais internacionais até o início de 2026.
Os desafios do país com as reservas no vermelho, entretanto, ainda não terminaram. E embora a inflação tenha diminuído drasticamente desde que Milei assumiu o cargo em dezembro de 2023, os preços elevados ainda persistem no país.
“A cobertura das reservas continua muito fraca”, disse o FMI. “É necessário mais trabalho para ancorar a inflação e fortalecer de forma duradoura a posição externa do país e a resiliência a um cenário global mais complexo.”
Segundo Dupita, da Bloomberg Economics, o empréstimo do FMI e a mudança no regime cambial “são muito bem-vindos” para a Argentina, e podem ajudar o país a entrar novamente no mercado de capital global, do qual está fora praticamente desde 2019.
“Hoje o país tem classificação de risco muito ruim e está fora dos índices de bolsa de mercados emergentes. Isto pode mudar com o tempo, conforme o país for reconstruindo suas reservas internacionais e demonstrar que segue firme no seu ajuste fiscal”, completa a economista.
*Com informações da agência de notícias Reuters.
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Fonte: G1