terça-feira, 13, maio , 2025 12:59

[Coluna] O Brasil e a construção de um eterno 14 de maio

E a perversidade de tudo isso, é que as raízes dessa desigualdade ficaram todas “no período da escravidão”, como se, de fato, o período pós-abolição tivesse sido uma espécie de alecrim dourado da história brasileira.

A escravidão foi uma instituição nefasta, que organizou mais de 300 anos da história brasileira. Mas a República não redimiu nada, simplesmente, porque não quis.

Porque o racismo silencioso era uma herança bem vinda, que azeitaria as desigualdades, lhes dando uma cara pálida de normalidade, que faz com quem não haja nenhuma comoção com o fato de ações policiais de São Paulo terem matado mais um jovem negro, ou que numa das cidades com maior número de chacinas contra a população negra e periférica, a Câmara Municipal gaste seu tempo e o dinheiro dos contribuintes debatendo e aprovando leis sobre bonecos.

O fim da escravidão deve ser celebrado, sem dúvida. Sobretudo uma celebração crítica, que nos permita compreender que o Abolicionismo foi nosso primeiro grande movimento social, e que houve um protagonismo negro e popular nesse movimento. Mas não podemos nos esquecer que vivemos num Estado em que a promessa daquele 14 de maio ainda não se cumpriu, e parte do Brasil tentou transformar a abolição num exasperante compasso de espera.

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Mestre e doutora em História Social pela USP, Ynaê Lopes dos Santos é professora de História das Américas na UFF. É autora dos livros Além da Senzala. Arranjos Escravos de Moradia no Rio de Janeiro (Hucitec 2010), História da África e do Brasil Afrodescendente (Pallas, 2017), Juliano Moreira: médico negro na fundação da psiquiatria do Brasil (EDUFF, 2020) e Racismo brasileiro: Uma história da formação do país (Todavia, 2022), e também responsável pelo perfil do Instagram @nossos_passos_vem_de_longe.

noticia por : UOL